A força das mulheres expatriadas na pandemia

Em meio à grande crise sanitária mundial, mulheres imigrantes relatam como está sendo o dia a dia em outro país. 

A força das mulheres expatriadas na pandemia


Migrar de país está longe de ser uma tarefa fácil. Por mais que exista o encantamento e a expectativa de uma vida melhor, seja no âmbito financeiro ou até mesmo em termos de educação, saúde e segurança, a verdade é que, só de pensar em iniciar essa transição, muitos sentem uma forte onda de ansiedade, que vem junto com o medo, estresse e tantos outros sentimentos que inundam o coração do imigrante. Mais cautelosas e atentas a detalhes, as mulheres geralmente participam da decisão desde o começo até a palavra final, se a família vai ou não começar o processo e se posicionar diante de um assunto tão delicado e difícil. “Há inúmeras que largam tudo, em busca de um futuro melhor”, explica o advogado especialista em Direito Internacional, Daniel Toledo. O sócio fundador da Toledo e Advogados Associados destaca que boa parte dessa insegurança — que é bem presente em quem decide mudar de país — é resolvida com um bom planejamento, tanto estrutural quanto financeiro. “É uma preparação que deve ser feita com um ou até dois anos de antecedência e, em todas as situações, contar com um profissional especializado para auxiliar em todas as etapas do processo”, aponta. De acordo com a mentora e especialista em transição de carreira, Marcella Brito, da Global Mentoring Group, a maior preocupação é sempre em aprender o idioma local e muitos acreditam que somente a fluência na língua será suficiente para estabelecer uma boa relação no novo país. 

“Cultura é convivência, partilha de alegrias e dores, compreensão de rituais e em tempos de pandemia, é preciso de uma dose extra de coragem, determinação e principalmente, paciência”, pondera. E foi o que fez a jornalista Carolina Tavarez, de 34 anos. Ela se mudou com o marido, no final de 2018, para Barcelona. “Na época, como eu não podia trabalhar e continuei a fazer trabalhos freelancers para o Brasil. Moramos em várias casas, em quartinhos apertados. Certa vez, alugamos um que tinha um buraco no chão e a cama precisava ser sustentada em tábua de carne. São situações que passamos, ficaram para trás e conseguimos evoluir graças a um sistema que dá suporte”, comenta. O maior desafio mesmo foi alinhar o puerpério com a pandemia. “Foram 24 horas em trabalho de parto, sem fármacos, sem anestesia e pelo sistema público de saúde. Minha filha nasceu em pleno Carnaval, no dia 23 de fevereiro, e dias depois, foi declarado o lockdown na pandemia. Somente agora que conseguimos vaga na creche, porque os dois trabalham e ainda com bebe, estava uma loucura”, relata Carolina. 

Em Portugal desde 2018, a influenciadora digital Cristina Maya ainda tem de lidar com os desconfortos de ser imigrante, com a saudade de viajar e tudo isso somado ao confinamento. “As medidas anteriormente adotadas foram renovadas no último dia 15, como era de se esperar. Não houve alterações e por isso, o país segue com as fronteiras fechadas e nada mudou quanto ao rigor das regras do Estado de Emergência”, conta. Cristina recorda que no primeiro fechamento geral, ela se arriscou a fazer compras de supermercado on-line, mas não é um hábito corriqueiro. “Tentei novamente comprar o que precisava dessa forma, afinal, esse tipo de estabelecimento fecha às 17h00 aos sábados e ficaria muito corrido. Outro ponto que me deixou chateada é que alguns itens selecionados não foram entregues, o que gera transtorno para quem está contando com certos ingredientes para um determinado preparo”, aponta. Além de todos esses desafios, tem que lidar com a questão emocional. Muitas pessoas que ela conhece decidiram voltar para o Brasil. Alguns ficaram apenas quatro meses, outros três anos, mas agora decidiram voltar para o país de origem. “E essas famílias muitas vezes são donas de animais de estimação, mas por conta da questão financeira, não conseguem levar o animal de volta e precisam doá-los, e isso me afeta profundamente”, afirma. 

A relações públicas Tatiana Fanti, de 37 anos, teve uma mudança de vida dupla. “Não só saí do Brasil como enfrentei um ano atípico de pandemia e lockdown. A primeira grande lição que aprendi na Alemanha, onde moro, é que aqui as coisas funcionam. Quando se fala em isolamento, realmente ficamos isolados. Não era permitido fazer sequer pequenas reuniões e o convívio se restringiu aos que moravam comigo”, aponta. Isso tornou os primeiros meses um grande desafio para ela, que se considera uma pessoa extremamente sociável e comunicativa e que recarrega suas energias estando ao lado de amigos. “Não tive isso aqui por quase um ano. Meu convívio social eram meus filhos (12 e 1 ano) e meu marido. Claro que a saúde mental ficou abalada e por algumas vezes senti aquele começo de depressão, quando a gente não tem vontade de levantar da cama. O que sempre me moveu foi a vontade (e necessidade) de fazer minha filha se adaptar ao novo mundo. Por ela, principalmente, não me deixei abater. Ela precisava me ver forte para saber que estava e que ficaria tudo bem”, destaca. Um ano e um mês depois, ela está mais adaptada à Alemanha e à pandemia. “Aprendemos a nos virar, embora eu ainda seja completamente iniciante no idioma, já estou desenvolvendo a minha rede de amigas, todas brasileiras e que, assim como eu, buscam pertencer de fato ao país”, finaliza. 

De porta em porta em busca de oportunidade Roberta Minuzzo, advogada especialista em Propriedade Intelectual, empresa especializada no registro de marcas e patentes, levou o negócio para os Estados Unidos há três anos. Ela, as duas filhas e o marido moram em Orlando, Flórida e chegaram em julho de 2018. Ao longo desse tempo, ela se dedicou a realizar parcerias e a entender melhor o mercado. “Os seis primeiros meses sempre são mais desafiantes. Nosso caso, quem mais sentiu a mudança foi a nossa filha adolescente por conta da língua e da cultura e também devido às amizades que ficaram no Brasil, mas jamais esquecidas. Os benefícios e a tranquilidade de morar nos Estados Unidos superam esses problemas, moramos em um lugar ótimo, perto da Disney e ainda gastando menos”. Para conquistar os primeiros clientes, Roberta conta que além de palestras e grupos de WhatsApp, ela ia até a empresa pessoalmente. “Eu pesquisava as marcas para verificar se estavam registradas. Caso não, eu preparava uma carta oferecendo os nossos serviços e citando que a marca estava desprotegida. Também ligava para agendar uma reunião com o empresário, que nem sempre atendia. O que eu fazia então, pegava esse documento e batia na porta da empresa. E se mesmo assim não conseguisse falar, eu deixava a carta e pedia que alguém entregasse. E assim foi, de um a um, trabalho de formiguinha e plantando as oportunidades. Depois que consegui o primeiro cliente, um foi indicando para o outro”, detalha. 

Morando fora desde 2012, a blogueira Suzana Lira também teve que lidar com diversos problemas durante a pandemia. Mas, ao invés de se lamentar ao ver o seu próprio negócio perder fôlego, iniciou um projeto para ajudar pequenos empreendedores. “Engajamos um grupo para fazer anúncios e publicações para ajudar essas pessoas. A ideia era causar um impacto na comunidade e, felizmente, conseguimos ajudar várias empresas”, comemora. Para os que ficaram no Brasil e trabalham na regularização migratória daqueles que migraram para cá, diversas questões foram enfrentadas, “pois os serviços de atendimento na Polícia Federal e também na Justiça Federal foram inicialmente suspensos ou diminuíram consideravelmente em quantidade, sendo feito apenas por agendamento. E, no início da pandemia, estava bem complicado conseguir agendamento para os imigrantes que gostariam de alterar sua situação migratória, mudar o tipo de visto ou até pedir a renovação de algum documento”, explica a Dra. Paula Brasil, que é especialista em política migratória e atua em São Paulo. “Além disso, diversos consulados e embaixadas também suspenderam a emissão de documentos e alguns serviços básicos, que antes eram comuns e não contavam com qualquer burocracia. Um exemplo foi o consulado dos Estados Unidos em São Paulo, que emitiu passaportes apenas em situações de urgência, desde abril até novembro”. Complementa a advogada. Diversos países dilataram os prazos para os documentos das pessoas imigrantes, contudo é sempre uma situação que gera muita insegurança e há diversas informações desencontradas. Cada site do governo traz uma determinada notícia, entretanto a situação demorou um bom tempo para voltar à normalidade. Outra grande preocupação é com as áreas de fronteira, com as migrantes grávidas e as crianças, pois chegar a um país com sua família e enfrentar o isolamento forçado, com as campanhas do “fique em casa”, como é possível para aquelas famílias que acabaram de chegar a um país?

Texto especial para o mês das mulheres! 💗

Com carinho,

Van

3 comentários :

  1. Cintia Caciatori03 março, 2021

    A força das mulheres realmente é inquestionável! Somos guerreiras e lutadoras! Imagina aquelas expatriadas num período tão difícil como a pandemia? Mas tudo passa, e a pandemia também vai passar! Vamos nos cuidar! abs!

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  2. Ahh, me senti representada. Adorei ler o relato dessas mulheres e me inspirar com toda essa força! Estou vivendo essa experiência de ser uma mulher expatriada. Mas estamos sendo abençoados. A situação no Uruguai está mais tranquila.

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  3. Esse é um assunto recorrente aqui em casa, especialmente nos últimos tempos... o Brasil anda tão exaustivo que é sempre uma inspiração saber que, apesar dos inúmeros obstáculos, a vida de expatriado traz muitos benefícios. Esses depoimentos todos são muito bons e realistas - e com certeza as mães são o alicerce para a adaptação da família toda.

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